Em ocasião do Dia dos Namorados passado há alguns
dias, aqui vai este texto sobre um dos maiores clássicos de Gabriel Garcia
Marquez...
Bem... cara, não é que eu seja um sujeito
insensível nem nada assim, mas, ultimamente quando vejo a palavra “amor” no
meio do título de um filme ou livro, costumo fingir que nem vi e passar reto...
sei lá, isso provavelmente por me remeter à profusão de “mela-cueca”, “água com
açúcar” e comédias românticas, enfim, todos esses enlatados holywoodianos meio
parecidos – e às vezes muito forçados – dos últimos tempos (lembro sempre de
ter ido certa vez ao cinema assistir “Cidade dos anjos” e acompanhar
atônito aquela choradeira de boa parte
da plateia no final do filme... Eca! – esse já não é tão novo, é verdade, mas é
um bom exemplo de filme romântico que fez sucesso e eu achei um grude
melequento dos infernos e deve ter ajudado mesmo a me “traumatizar"... me
vem até de dizer que Cidade dos anjos, o c*, filmaço romântico de fazer chorar
é Cidade de Deus, p*!!)...
Pois, bom, para provar que não tenho um coração de
gelo e sou, sim, também um romântico, digo aqui que gosto bastante, só para
exemplificar alguns, dos filmes “Em algum lugar do passado” (com seu paradoxo
do relógio que faz o pessoal da geração mela-cueca virar mela-cuca por quase
fundir a mesma ao se indagar, “mas como é possível...”, mostrando que são
românticos de meia tigela, afinal o ponto-chave da história, o verdadeiro
romance dela – e, por que não?, da vida em geral – está exatamente aí, no
paradoxo, no impossível... ahá! Essa ficou boa), “Antes do amanhecer” (com seus
diálogos bacanas e não aquele festival indiscriminado de “eu te amo!” e “você
me completa!”), “Brilho eterno de uma mente sem lembranças” (não se deixe levar
pelo preconceito contra o Jim Carrey; embora ele esteja bem e não comprometa
neste, de qualquer forma a Kate “Titanic” Winslet não deixa a peteca do filme
cair – o que seria difícil de qualquer maneira, devido à ótima trama, ganhadora
inclusive de Oscar de roteiro original), e “Cinema Paradiso”, que já vi e revi
e provavelmente vou rever ainda, por estar mesmo no meu top 10 (e isso numa
classificação “geral”, e não só entre filmes românticos)...
Bom, mas, enfim, feita aqui a minha defesa, não era
sobre isso que queria falar exatamente. Ao menos não sobre filmes (embora vá
mencionar ainda mais um na sequência). Mas sim sobre um livro, que tem o tal
“amor” no título também, mas, felizmente, está longe de ser um mela cueca ou um
água com açúcar... não, esse sim é que é um romance romântico de verdade, meus
amigos!
A partir de agora, cuidado, há a possibilidade/
probabilidade de spoiler no lance (spoiler, sempre dando o toque
pra quem não sabe, é o ato fdp de “entregar o ouro”, contando partes
importantes e/ou até mesmo o final de filme ou livro).
Neste romance do mestre colombiano (que,
infelizmente, como revelou seu irmão recentemente, está perdendo a memória e a
lucidez, devido à demência senil), no qual não há, diga-se de passagem, nenhum
Buendía perdido pelo caminho, o protagonista é Florentino Ariza, que desde garoto é apaixonado
pela bela Fermina Daza e com a qual se corresponde através de cartas na
juventude. O pai desta, porém, ao descobrir aquele flerte, manda Florentino
procurar outros ares, pois não o considera um pretendente à altura para sua
filha... eles acabam por afastar-se um do outro e em seguida ela casa com um
dotô rico que chega na cidade.
A partir daí, Florentino Ariza decide esperar pela
amada, nem que leve a vida toda para ficarem juntos – e (SPOILER! SPOILER!)
é quase o tempo que leva mesmo para isso finalmente acontecer... vale salientar
que, embora sempre com a amada no pensamento, Florentino não se abstém das
outras mulheres do mundo: não, pelo contrário; o sujeito passa o rodo em
simplesmente TODO rabo-de-saia que cruza seu caminho... porém, romanticamente, sempre
pensando na amada (digamos assim que numa espécie de treinamento para quando
estivessem juntos)...
Foi feita uma versão hoolywoodiana do livro para o
cinema (com o Javier Barden no papel do Florentino Ariza e Fernanda Montenegro como mãe do protagonista), que, digamos, até
que não é tão mau (vale essencialmente pela presença da belíssima Giovana
Mezzogiorno no papel da Fermina Daza)... mas... hummm... sinceramente, achei
meia boca e não recomendaria com muita ênfase (pra não dizer que
definitivamente não recomendo, ou, ao menos, recomendo que se leia primeiro o
livro – e depois, ok, se assista o filme e se decepcione com ele! Mas não se faça
o caminho inverso, para não estragar o ótimo romance... e, bem... na verdade,
para essa dica fazer sentido, o leitor não deveria nem estar lendo esta resenha,
certo?... assim sendo, se leu até aqui, fazer o quê, né? Obrigado pela
preferência! Já não precisa mais ler o livro, pois contei-o todo aí em cima e
não precisa mais assistir ao filme, já que o que vale nele é a Giovana e é ela
está aí embaixo pra você...).
Enfim, isso é que é romantismo de verdade, sem aquela
pieguice grudenta da maioria dos últimos filmes e livros de “amor” da vida...
fica a dica para a geração mela-cueca, de um grande romance romântico, que pode
dar inclusive aos sonhadores de plantão algum alento ao se fazer vislumbrar
aquele romance perdido no passado que você tanto fantasia ressurgindo um dia –
e, ao menos no caso do livro, concluindo-se num futuro (beeeem) distante com um,
literalmente, final feliz.
Ps: Ah, sim,
o cólera (ou “a” cólera) do título se refere não à ira, fúria, e sim à doença
transmitida pelo vibrião colérico (ver livros de biologia do segundo grau)...
A trama do livro se passa na Colômbia de Garcia Marquez numa época de epidemia da
mesma que dizimou boa parte da população e que, aparentemente sendo mais uma
dificuldade imposta pelo destino aos amantes, dando um tchan a mais no romance,
no fim das contas acaba mesmo por ajudar a uni-los.
Moral da
história: sem dúvida, pode haver vida inteligente em romances com o amor no
título - às vezes, contudo, talvez só seja necessário um leve contraponto a ele para
se atingir o devido equilíbrio.
(por Diego T. Hahn)